Quotes #2


Gosto muito do estilo de escrita da Fernanda Young. É como se ela usasse seus livros para fazer suas confissões mais intimas e denuncias que não são bem recebidas, usando a voz do protagonista. Não são livros autobiográficos – ao menos os dois que li -, mas sinto que seus narradores são seus próprios pensamentos. Como quando falamos sozinhos, mas internamente, discutimos horas com nossos ideais e sabemos que algumas coisas não são fáceis de serem ditas e aceitas. 

Não sei se vou fazer resenha desse livro, pois fiquei um pouco decepcionada com algumas partes. O livro é, na verdade, uma carta muito longa – que ela chama de livro - de uma filha que se sentia indesejada desde a infância, a seu pai moribundo. A filha, que não se apresenta, pretende contar para o seu pai tudo o que ela sentiu, fez ou teve vontade de fazer devido à criação relapsa. Na carta-bomba, ela relata todas as minúcias que marcaram sua existência e claro, o dia em que tentou matar sua mãe. Ou seja: ela disseca da maneira mais ácida, a relação de pais e filhos.

Algumas pessoas não gostam de palavrões nos livros e eu acho isso até compreensível, mas não me importo de verdade. Em determinadas situações, desde que não sejam com mais frequência do que necessário, acho que aproxima o leitor. Porque usar um “filho da puta” aqui e ali, é tão comum, gente! Mesmo que moralistas tentem dizer que não, que é feio. E a Fernanda Young não tem papas na língua, mas escreve muito bem. É como uma Marta Medeiros desbocada.

O motivo do meu desapontamento é que o livro tinha um grande potencial. Tudo que você não soube é bom, principalmente no inicio, mas a coisa vai desandando depois do meio. Talvez fosse a intenção da Young; a filha não ter mais certeza do que escrever, as coisas terminarem de forma rasa. O problema é que isso acontece de modo que eu chego até a questionar a qualidade do começo.

Tudo que você não soube
Fernanda Young

"Some-se isso a completa incapacidade, por parte de um estrangeiro, de avaliar os efeitos colaterais do Brasil sobre os proprios brasileiros. Essa nossa exposição diária ao horror, como se fosse normal, e essa total ausência de responsabilidade social que nos cerca. Aqui, aprende-se cedo que ser é ter, sem se saber aprender como se fazer para ter; então não importa se for trabalhando ou roubando, dá tudo no mesmo. Ir na direção do possuir é o que fará você ser aceito, sendo meia dúzia de crimes no decorrer do caminho algo perfeitamente aceitável." 

"Mas outra coisa que aprendi nessa vida é que substituições não existem. Nunca dão certo, quer dizer. Então é melhor nem tentar. Sabedoria que só se atinge quando sofre longamente por um amor. Qual é o primeiro pensamento do sofrido amoroso? É: vou arranjar outro amor, o mais rápido possível. Não funciona, pai. Tem o rito de passagem. Tem o luto necessário. Tem todo o aprendizado com a perda."

"Eu não sou uma babaca. Um babaca é um sonso. Um babaca é traiçoeiro. Um babaca se sobressai pela caretice. Nem digo caretice do setor sexo, drogas e rock’n’roll – careta porque tem preconceito daquilo que não entende. Para perdeu meu amor, um filho teria que ser babaca assim, caretão sete cruzes. Daqueles que trapaceiam, vilipendiam e transformam suas invejas, naturais, em sentimentos inumanos. Precisaria ser um politico desses nossos, que roubam dos hospitais públicos, que patrocinam a miséria com descaramento e deboche. Mas aí não seria apenas um babaca, seria um filho da puta." 

Mas não há como evitar: ser menina é um problema. Mais um. Principalmente, para as meninas que nascem aqui no Brasil, um país onde a mulher, além da obrigação de ser bonita, tem a obrigação de ser a dona da alegria. Aqui, mulher tem que fazer comida e fazer charme. Tem que ter coragem e bunda. Tem que saber sambar e saber o seu lugar. Uma barbárie. Aposto que você nunca tinha pensando nisso, tinha? Nenhum homem pensa. Eu penso. Sobre como nos querem festivas e subjugadas. Efusivas e caladas. Dadas e reservadas. O Brasil é macho, muito macho.”
A intenção inicial ao começar a escrever o post, era selecionar citações para preencher a coluna de Quotes, mas quando vi já tinha escrito praticamente uma resenha, haha. Daí juntei os dois e ficou um Quotes, com uma pequena introdução, já que acho que não será necessário resenha depois disso. Se interessaram? Ou curtiram os quotes, pelo menos?

14 comentários:

Carol Ardente disse... [Responder comentário]

Eu nunca li nada da Fernanda e não me interessei tanto, até chegar ao ultimo quote. :) A Fernanda disse tudo nesse! HUAHAU. É, também percebi que você meio que escreveu uma resenha HUAHUA.
Luana, eu amei o layout! Muito lindo. A Gi arrasou de novo! :)
Ótimo post!
Beijos ;*

@anacarol_isa

Aione Simões disse... [Responder comentário]

Quase uma resenha?
Pra mim foi uma resenha! Hahaha
Adoro o jeito que você escreve, Lu, e gostei das considerações que fez sobre o possível motivo pra história ter desandado.
Eu também não me importo com palavrões, acho que qualquer coisa, desde que sem exageros, pode ser utilizada.
Adorei o último quote!
Beijão!

Danniele disse... [Responder comentário]

Amei os quotes, principalmente o segundo! *-* Você tem razão, Lua, o post ficou meio resenha e até me deu vontade de ler sabe, não tenho "preconceito" com palavrões em livros, desde que seja como você disse na quantia necessária. Sempre quis ler algo da Fernanda Young *-*

Beijos :*

Papel com Batom disse... [Responder comentário]

Oi :)
Nunca li nenhum livro da autora, mais esse me despertou um certo interesse!
Também não me importo com palavrões em livros, como você disse, aproxima o leitor e é inevitável, no dia a dia sempre escapa algum! É normal.
Adorei!

Beijos ^^

Flávia Pachêco disse... [Responder comentário]

Adoro essa coluna de quotes *-*
Adorei todos eles, principalmente o quarto, rsrs. E para mim, a "introdução" também foi uma resenha! haha. Como a Aione disse, o jeito que você escreve é incrível, eu adoro, sei lá, é tão meigo e direto *.*
Isso dos palavrões depende né, quando é com muito exagero deixa tudo horrível, aliás, tudo que é exagerado acaba sendo ruim; mas não vejo problema e ter um ou outro!

Beijos,
@flafsbp
{ http://17ezesseteinvernos.blogspot.com/ }

Unknown disse... [Responder comentário]

Lu, eu ia dizer justamente isso! A sua não intenção de uma resenha, ficou mais completa do que muitas outras resenhas que vejo por aí! ^^
Achei o livro bem interessante, pelo menos a partir dos quotes que você selecionou! Realmente uma pena que o final tenha decepcionado a ponto de eclipsar o resto. Acho péssimo quando um livro começa com tudo pra ser bom e depois acaba decaindo! Mas gostei de saber dessa leitura, que parece ser bem diferente, difícil dizer qual quote gostei mais! =)
Beijos!

Gabi Orlandin disse... [Responder comentário]

Oi! Posso chamar de resenha, então? Haha. Vou dizer que acho que não me interessaria muito pelo livro porque vi que ele trata muito de questões da sociedade em que se vive. Não curto muito isso. Mas adorei o último quote sobre nascer mulher no Brasil. Não tem como ser mais verdade! Se tivesse oportunidade (e tempo), leria só pra conhecer, mas tenho minhas dúvidas se iria gostar.
Beijo.

Evellyn disse... [Responder comentário]

Eu não conhecia o livro e tb nunca fui particularmente fã do estilo Young (não lembro de ter lido algo dela) mas achei seu comentario bem sincero! Achei legal vc falar que pelo fim, vc questiona o inicio.. rs
Os quotes são interessantes, mas não sei se leria.. Parece mais um livro que 'fica bom em quotes' mas como uma narrativa completa, talvez canse?

bjs
Evellyn!

Carol disse... [Responder comentário]

Não fico muito feliz quando o livro desanda no meio... dar uma vontade de desistir e palavrões... usamos toda hora na vida real e como os livros imitam nossas ações nada mais justo que haja mil palavrões nos livros hahahaha

Beijos.
#Resenha falada.

Luara Cardoso disse... [Responder comentário]

Eu nunca li nada da Fernanda Young. Na verdade, eu não gosto muito dela, nunca gostei. Acho que peguei implicância por causa da minha mãe. Ela sempre me disse que ela era doida, sabe? Ah sei lá.
Mas você disse tudo: uma palavrão aqui, outro ali... todo mundo fala! haha

Um beijo,
Luara - Estante Vertical

Dana Martins disse... [Responder comentário]

Eu nem sabia do livro e não foi daqueles que me chamou muita atenção. O que ficou na cabeça foi você falar dos palavrões, porque eu estava escrevendo sobre isso justamente hoje em uma resenha de Apocalipse Z. Eu acho bobeira reclamar de palavrão em livro, principalmente porque muita gente fala na realidade. É claro que desnecessário, como você disse, não é legal, mas dentro de um contexto é até perfeito. Acho que o estranho é fazer um livro sobre um monte de jovens comuns e não ter um palavrão que seja. ;x

Ana Ferreira disse... [Responder comentário]

Lu,

Nunca tive muita curiosidade em ler algo da Fernanda Young, não por nada em especial, mas o único livro que me lembro de ter visto com o nome dela foi "O Pau" e achei o título, por que não, engraçado. Até hoje não sei do que se trata, mas lendo as quotes que você disponibilizou aqui, criei um respeito por ela. Se tem coisa que admiro, é literatura engajada. Nada como a arte das palavras para carregar críticas sociais intrínsecas. Os dois últimos trechos sobre ser babaca e ser mulher foram os melhores. Assim como muitos, não me incomodo com palavrões em livros, acho que dão um ar mais chulo e natural à história. Uma questão de estilo, sem exageros, claro.

Lu, te indiquei pra um meme lá no blog! :)

Beijinhos,
Ana - Na Parede do Quarto

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